A cidade partida: desigualdade urbana e os novos mapas sociais do Rio de Janeiro

O Rio de Janeiro sempre foi uma cidade marcada por contrastes. De um lado, praias mundialmente conhecidas, bairros de alto padrão e um estilo de vida associado ao glamour. De outro, comunidades carentes, carência de serviços básicos e violência cotidiana. Essa dualidade, que nos anos 1990 ficou conhecida como “a cidade partida”, segue atual, mas ganhou novas formas com a expansão imobiliária, a crise econômica e a reorganização social nos últimos anos.

A origem do termo “cidade partida”

O conceito se popularizou a partir da obra de Zuenir Ventura, que nos anos 1990 descreveu como a cidade era atravessada por uma linha invisível que separava ricos e pobres, asfalto e favela, privilégios e exclusão. Três décadas depois, a geografia social do Rio mudou, mas a desigualdade continua estruturando a vida urbana.


Novos mapas sociais

Nos últimos anos, a valorização de áreas como Barra da Tijuca e Recreio consolidou a expansão da classe média alta para a Zona Oeste. Ao mesmo tempo, bairros da Zona Norte e comunidades próximas ao Centro enfrentaram queda de investimentos, insegurança e precarização de serviços públicos.

Enquanto condomínios fechados oferecem segurança e infraestrutura particular para parte da população, muitas favelas seguem com saneamento precário, transporte deficiente e presença dominante do crime organizado. A fronteira entre esses dois mundos, em vez de desaparecer, se tornou mais complexa e fragmentada.


O papel da violência

A desigualdade urbana no Rio não pode ser explicada sem a dimensão da violência. Milícias e facções disputam territórios, impondo sua própria ordem em regiões abandonadas pelo Estado. Para quem vive nessas áreas, o cotidiano é marcado por regras paralelas, limitações de circulação e insegurança constante.

A violência reforça a segregação, afastando investimentos e ampliando a desvalorização de bairros periféricos.


Infraestrutura e mobilidade

Outro retrato da cidade partida está na mobilidade urbana. Enquanto áreas nobres contam com obras de expansão do metrô e vias expressas, boa parte da população depende de ônibus lotados, trens superlotados e transporte irregular. O tempo de deslocamento de quem mora em áreas periféricas é muito maior do que o de quem vive em bairros de alto padrão.

Essa desigualdade no acesso à cidade impacta diretamente o emprego, a renda e a qualidade de vida.


Educação e serviços públicos

A divisão também aparece nos serviços públicos. Escolas e hospitais localizados em regiões mais carentes sofrem com falta de professores, médicos e infraestrutura. Em bairros valorizados, a população recorre ao sistema privado, criando um abismo ainda maior entre quem pode pagar e quem depende exclusivamente do Estado.


Resistência e novas formas de organização

Apesar do cenário adverso, muitas comunidades se organizam para resistir e criar soluções próprias: projetos de educação popular, cooperativas de trabalho, coletivos culturais e iniciativas de comunicação independente. Essas experiências mostram que a cidade partida não é apenas um retrato da desigualdade, mas também um espaço de criatividade e luta por direitos.

O Rio de Janeiro continua sendo uma cidade marcada por fronteiras invisíveis, que separam oportunidades, serviços e direitos. A “cidade partida” de Zuenir Ventura se transformou, mas não desapareceu.

Hoje, os novos mapas sociais revelam uma metrópole ainda profundamente desigual, onde o CEP determina expectativas de vida, acesso à saúde, à educação e até mesmo à sobrevivência. Superar essa realidade exige políticas públicas duradouras, combate à violência e, sobretudo, a construção de uma cidade mais justa e inclusiva.

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